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Autismo e vícios: qual a relação?

16.05.2023
Autismo

A comunidade científica tem pouco material sobre a relação entre o diagnóstico de autismo e vícios. Entretanto, alguns estudos prévios já sugerem que autistas têm mais chances de desenvolver dependência química, em comparação à população em geral.

Destacaremos três fatores como fundamentais para uma compreensão mais ampla do assunto: o diagnóstico tardio, o autismo na vida adulta e as comorbidades associadas ao transtorno.

O que é o autismo?

Historicamente, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem sido considerado um transtorno infantil. Com isso, a comunidade autista vive uma carência de estudos e abordagens direcionados às experiências de jovens e adultos.

O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento, de origens majoritariamente genéticas, caracterizado por dificuldades sociais e de comunicação, comportamentos repetitivos e interesses restritos. As pessoas autistas, de maneira geral, podem apresentar variações no perfil cognitivo, que englobam experiências sensoriais e processamento de informações atípicas, além de prejuízos nas habilidades motoras e intelectuais.

Apesar de ser mais comumente diagnosticado na infância, o TEA não tem cura e acompanha o indivíduo ao longo de toda a vida. Sendo assim, é crucial compreender e apoiar essa vivência em todas as fases, o que não parece ser possível no momento, uma vez que, segundo revisão literária, menos de 2% das pesquisas acerca do TEA são dirigidas à população adulta.

O impacto do desconhecimento sobre autismo na vida adulta

O número de pessoas autistas pode ser maior do que os diagnósticos oficialmente registrados. Dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), apontam que, atualmente, 1 em cada 36 crianças seja autista. Isso significa que muitas pessoas podem passar despercebidas ou receber o diagnóstico apenas na vida adulta.

Nesse sentido, podemos questionar as consequências dessa negligência. Quantas dessas pessoas acabam se expondo a diversas situações de risco durante o seu crescimento, por não se sentirem compreendidas e pertencentes? Quantas recorrem a hábitos e situações tóxicas devido à exclusão e discriminação decorrentes da falta de um diagnóstico adequado?

Autismo, álcool e drogas: um problema real, mas pouco discutido

Antes de mais nada, é preciso desapegar da ideia de que pessoas autistas não consomem drogas lícitas ou ilícitas. Como qualquer indivíduo, um autista pode desenvolver dependência química. Alguns fatores que podem colaborar para isso são:

  • Tentativa de amenizar características do TEA, como dificuldades de comunicação e interação social e questões sensoriais;
  • Busca por meios de camuflar aspectos comportamentais do autismo;
  • Histórico de abuso de substâncias na família;
  • Tentativa de amenizar sintomas de comorbidades associadas ao transtorno, como ansiedade e depressão;
  • Automedicação e efeitos colaterais de tratamentos medicamentosos sem acompanhamento médico;
  • Busca por pertencimento a grupos e contextos sociais.

Autistas têm mais chances de relatar vulnerabilidade associada ao uso de substâncias, revela estudo

A comunidade científica ainda não tem conclusões definitivas se autistas apresentam ou não uma maior vulnerabilidade ao uso de substâncias em comparação com pessoas neurotípicas. No entanto, um estudo publicado em 2021 na revista científica The Lancet, fornece evidências relevantes sobre o tema.

A pesquisa sugere que autistas têm quatro vezes mais chances de relatar vulnerabilidade associada ao uso e abuso de substâncias como álcool, cigarro e drogas ilícitas como forma de lidar com questões psicológicas. Além disso, adultos autistas são quase nove vezes mais propensos a relatar o uso de substâncias recreativas para lidar com sintomas relacionados ao transtorno.

De acordo com o estudo, essas substâncias são utilizadas para enfrentar a sobrecarga sensorial, fobias, dores, falta de concentração, dificuldades com rotinas e alterações de comportamento e sociabilidade. A pesquisa também sugere que os autistas recorrem ao uso de álcool e drogas para camuflar suas características, além de aliviar ou gerenciar sintomas de saúde mental, como ansiedade, depressão e pensamentos suicidas.

Para além das drogas e do álcool: outros vícios que trazem prejuízos para diagnosticados com autismo

Mesmo que o enfoque deste texto seja no abuso de substâncias como álcool e drogas, não poderíamos deixar de falar de outras práticas que impactam pessoas com o laudo de autismo. Um problema cada vez mais observado, não apenas na população infantil do espectro, mas também na vida adulta, é o vício em telas. O uso excessivo de dispositivos eletrônicos, como jogos de vídeo, televisão e outros meios digitais, pode ter impactos significativos na vida de indivíduos autistas.

Para pessoas no espectro, que muitas vezes têm interesses restritos e dificuldades na interação social, as telas podem oferecer uma forma de escape e conforto, tornando-se uma fonte de prazer e controle. No entanto, o uso excessivo pode levar ao isolamento, falta de motivação para outras atividades e comprometimento do bem-estar emocional e físico.

Autismo e vícios: o tratamento necessário

Diante dessas informações, é imprescindível ampliar o conhecimento científico e desenvolver abordagens e intervenções adequadas para auxiliar pessoas com diagnóstico de autismo na prevenção e tratamento de vícios em drogas e álcool.

A psicoterapia, aliada a tratamentos medicamentosos controlados, é um dos caminhos mais seguros a se seguir. Além disso, também é importante trabalhar na difusão de mais conhecimento sobre o autismo e o diagnóstico precoce. O TEA é para toda a vida, e o suporte adequado em todas as fases é essencial para promover uma vivência mais saudável para os autistas.

Por fim, é essencial estabelecer estratégias de inclusão nos mais diversos meios da sociedade. Dessa maneira, não só as pessoas autistas, mas todas as que fazem parte da neurodiversidade, não estarão sob o risco de procurarem estratégias que comprometam sua saúde física e mental para se sentirem aceitas e pertencentes.

Referências

  • LIN, J.; GAIATO, M. H. B. .; ZOTESSO, M. C. .; SILVEIRA, R. da R. .; FERREIRA, L. Transtorno do espectro autista e envelhecimento: uma revisão narrativa. Revista Remecs – Revista Multidisciplinar de Estudos Cientí­ficos em Saúde[S. l.], v. 8, n. 14, p. 3–11, 2023. DOI: 10.24281/rremecs2023.8.14.3-11. Disponível em: https://www.revistaremecs.com.br/index.php/remecs/article/view/1050. Acesso em: 16 maio. 2023.
  • WEIR, E.W. et alCompreendendo o uso de substâncias por adolescentes e adultos autistas: uma abordagem de métodos mistos. Cambridge, julho de 2021. Disponível em: https://www.thelancet.com/action/showPdf?pii=S2215-0366%2821%2900160-7. Acesso em: 16 maio. 2023.
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Autor(a): Equipe Instituto Singular

Psicólogas e Terapeutas

Esta dica foi escrita em conjunto por algumas psicólogas e terapeutas do Instituto Singular. Todos os artigos deste site são escritos por profissionais especializados em autismo e desenvolvimento infantil.

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